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quinta-feira, 29 de abril de 2010

Dos grilos 1

A caça ao grilo sempre foi ali uma cerimónia com a liturgia do silêncio, um ritual mudo. Noutros lugares, o acto é sonoro, mais profano, com os meninos autorizados, pelo grilo, a emitir cantorias na veação.

Há-as funestas:


Grilinho sai, sai

Que mataram o teu pai.


Há-as de poética melopeia:


Grilinho à porta

Que andam as cabrinhas na horta.


Há-as de matiz popular:


Grilo, grileiro

Está à porta o João gaiteiro.


Pelo rigor dos versos responde o Professor Carlos Teixeira em “Superstições da Terra de Rossas”, estudo publicado em 1934 e que a junta da freguesia berço do erudito investigador e geólogo reeditou em 1996, com Limiar e poético Prefácio. O mesmo rigor, seguramente, com que Carlos Teixeira e Torre Assunção estudaram – na aldeia da Castanheira, chão de Arouca – outros seres fantásticos aparentadas aos grilos: as pedras parideiras, criaturas que – como é sabido – o povo ouve cantar, doloridamente, nas noites de parto.

Voltemos aos grilos.

O silêncio ou o palavreado, aquando da captura, modelam o sentimento, o timbre das cordas vocais, por assim dizer, dos artistas. Deste modo, há-os mais melodiosos, mais calados, mais tendenciosos para a ópera, mais para o fado. E, entre os fadistas, toda a gente sabe, há dos que lhes tomba a asa para Lisboa, para Coimbra. Como os grilos, exactamente.

Influência na canção, diz-se, terá também o regime alimentar. Há primorosos trovadores com serradela ou alface tenra e um torrão de açúcar. Amarelo. Outros lhes basta sorver o hálito do Verão. Nas asas.


Augusto Baptista

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