free counters

quinta-feira, 2 de outubro de 2025

Ode ao gato


Canto a insolência

dos teus passos

a indiferença

com que olhas os poderosos

os avalias

num desdém

a roçar a impertinência.

 

Canto os teus dengosos bate-papos

com o sol

este sol do sul

luminoso e quente

e me pergunto

de que falarão vocês

enrolados

um no outro assim

que assuntos calorosos

vos retêm tão entretidos

pela tarde adiante.

 

Canto a eloquência

do teu discurso de silêncio

os enunciados

libertários que proclamas

no leve roçagar

do teu corpo

carregado de cio

entre as pernas

das velhas freguesas

da mercearia.

 

Canto o teu doce enleio

entre malmequeres

no campo

pequenos sóis que alegram

o cabelo das raparigas

e tu

pequeno príncipe

das trevas

tu que tudo vês

e sabes

de olhos fechados

libidinoso

a ronronar ausente

no colo delas.

 

Canto a partícula cósmica

que um dia foste

e fascinada

por esta bola

azul às voltas

de longínquas paragens

saltaste

salto timorato

de quem não mede

tempo nem distâncias

não avalia as consequências

astronómicas

dos impulsos instintivos

um pulo de cortar a respiração

sete vezes

e

vertigem

de estrela cadente

esse grão de pó

ou ainda menos

que eras tu então

desde os confins

do espaço

sideral

riscando o céu

em fogo

i

n

f

i

n

i

t

a

m

e

n

t

e

te fizeste

forma

animal

aqui

caindo

 

de pé!

 

De pé

como as árvores

que não tremem

diante do machado inclemente

e se inquietam na suave

brisa matinal.


Augusto Baptista

Sem comentários:

Enviar um comentário